Academia Internacional de Cinema (AIC)

Tendências Narrativas na 12ª Semana de Cinema e Mercado

palestra sobre roteiro na aic

No terceiro dia da 12ª Semana de Cinema e Mercado, a Academia Internacioal de Cinema (AIC) recebeu as roteiristas  Luiza Fazio e Carolina Nishikubo, com mediação do professor de roteiro Elzemann Neves para uma conversa sobre as Tendências Narrativas. Em um clima descontraído, o bate-papo trouxe muitos ensinamentos sobre o mercado de roteiro, a construção da carreira e o DNA brasileiro nas produções.

Ex-aluna do curso de Roteiro para Séries da AIC, Luiza Fazio relembrou sua trajetória na escrita, desde a adolescência, quando escrevia de maneira colaborativa a partir da perspectiva de personagens de Harry Potter até a conquista do primeiro trabalho. “Fiz uma lista no Excel com 150 produtoras e mandei e-mail para todas me apresentando. Três responderam, duas marcaram reunião e uma pediu para eu retornar em três meses. Fiquei fazendo isso até que, em nove meses, eles me chamaram.” Luiza ressaltou que é necessário ser insistente, mas sem ser inconveniente, sempre mantendo a educação. “Durante este trabalho, começaram as reuniões com o Kondzilla e, como eu sabia muito sobre ele e seu trabalho, comecei a participar das reuniões para fazer anotações e, aos poucos, fui entrando em Sintonia”.

Carolina Nishikubo compartilhou com as mais de 80 pessoas presentes que, no início, começou a escrever o que gostaria de assistir, mas percebeu que precisava ir além: “Ao longo dos anos, fui pensando mais sobre o que eu quero falar e o que é importante para o mundo ouvir. É importante também ter a visão do mundo, entender o que o mundo pode olhar e debater sobre”.

Roteirista Luiza Fazio compartilha sobre sala de roteiro durante palestra na AIC

Como Funciona uma Sala de Roteiro

O professor Elzemann perguntou sobre o funcionamento das salas de roteiro e como administrar os prazos com o processo criativo. “Quando o streaming compra, eles dão algumas páginas como guia, e por alguns meses ficamos fazendo um grande brainstorm. Pensamos em quem são as personagens e quais são suas histórias individuais, debatemos os arcos, as emoções dentro da história e os temas. A partir daí, começamos a criar a sinopse por episódio, desenvolvendo pequenos textos e ideias sobre as personagens e o que vai acontecer na temporada. Junto com o chefe de sala, definimos o que vai seguir de cada ideia, e cada roteirista escreve de um a dois episódios, pegando pequenas sinopses e personagens e dividindo em cenas, diálogos e vozes. Então, levam para a produtora e ela adapta para o que quer”, contou Luiza.

Para Carol, a equipe e os prazos ajudam na entrega: “Quando tem prazo, você faz. Quando tem produtora e diretor, você não está sozinho; tem pessoas pensando em ideias e como elas vão evoluir, e nisso fica mais fácil. Na escrita autoral, é diferente; os ritmos mudam e o objetivo fica meio ‘jogado’”.

Mudança no roteiro no Set de Filmagem

Outro assunto debatido foi a fragilidade da história quando ela vai para os sets de filmagem e as mudanças no roteiro sem a presença dos roteiristas no set. “É importante pensar no projeto e em quem manda, porque, quando você vai filmar, aquela história que era de cinco pessoas se abre para cem. O roteiro é uma parte frágil que todos querem influenciar, dizendo como tem que ser e como desenvolver a história”, disse Carolina Nishikubo.

Para Luiza, a criação de séries brasileiras carece da presença do showrunner, um profissional muito comum em obras internacionais. “Quem faz as séries veio do cinema e, quando falamos em séries, quem manda ainda é o diretor, porque temos anos de tradição do autor ser o dono da obra e o roteirista poucas vezes está no set de filmagem. Por isso, as séries americanas dão certo: quem manda é o showrunner – a pessoa que está na sala de roteiro todos os dias, que escreve o episódio inicial e final, que está dentro do set e no processo de edição. O showrunner é como o autor de uma novela, mas não importamos isso para as nossas salas. Muitos diretores se auto-intitulam showrunner porque mudaram algo na história na hora. Muitos diretores mudam uma cena e querem se colocar como showrunners”, opina Luiza.

Roteirista Carolina Nishikubo compartilha sobre brasilidade nas produções audiovisuais em palestra na AIC

Brasilidade no Cinema

Trabalhar elementos da brasilidade nas produções audiovisuais é fundamental para refletir a diversidade e a riqueza cultural do país. Luiza Fazio destaca que a Netflix tem conseguido trazer temáticas brasileiras para o público global, como evidenciado no sucesso de séries como Cidade Invisível e Sintonia, além de obras da Globoplay que incorporam a estética do cinema de Recife, como Justiça.

Carolina compartilha dicas para novos roteiristas: “Precisamos sempre estar ligados no mundo, no que está acontecendo, trazendo características que tiramos do nosso imaginário do lugar colonizado e conectando-as ao que de fato se assemelha ao nosso DNA.” Porém, ela alerta para um cenário em que as tendências são ditadas pela lógica do mercado: “Tem o lado do produtor que está vendo o dinheiro e o que está dando lucro hoje em dia é melodrama, doramas, e todo mundo está procurando isso. No entanto, fazer algo apenas pela tendência do momento pode não ser viável no futuro. A direção pelo dinheiro às vezes não traz histórias boas”, e conclui dizendo que é preciso pensar em histórias com DNA, que o público precisa ver.

Inteligência Artificial para Roteiristas

A discussão sobre a inteligência artificial (IA) e seu impacto no trabalho dos roteiristas é complexa. Carolina Nishikubo ressalta que, embora a tecnologia não possa ser parada, ela pode ser utilizada como uma ferramenta auxiliar na pesquisa e no desbloqueio criativo. Ela acredita que a narrativa continuará a ser uma habilidade essencialmente humana, mesmo com a evolução da IA. Luiza Fazio, por sua vez, expressa cautela ao alimentar essas ferramentas com suas ideias, afirmando que a verdadeira essência da contação de histórias reside na experiência e na sensibilidade humanas.

O Primeiríssimo Passo para Novos Roteiristas

As profissionais compartilham dicas sobre como estudantes e novos roteiristas podem se preparar para o mercado. O primeiro passo é escrever: desenvolver a logline, a sinopse, o tema, o arco narrativo, os perfis dos personagens e um episódio piloto, que deve ter entre 30 e 40 páginas. É importante que esse material seja revisado e apresentado a outras pessoas, incluindo professores. A disciplina de escrever e revisar constantemente é fundamental, pois isso garante que você esteja preparado quando surgir a oportunidade de conversar com alguém, participar de concursos de roteiro ou se inscrever em editais.

 

*Fotos: Lucylli Alves

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