Academia Internacional de Cinema (AIC)

“Peripatético”, filme da aluna Jéssica Queiroz, estreia amanhã no Festival de Brasília

peripatético

Por Katia Kreutz

Curta-metragem fala sobre a invisibilidade dos jovens da periferia

Quinze minutos não é muito tempo para contar uma história, especialmente se ele for inspirada em acontecimentos reais. No entanto, a cineasta Jéssica Queiroz, ex-aluna da Academia Internacional de Cinema (AIC), consegue levar o espectador para dentro da vida de três adolescentes da periferia em seu curta Peripatético, que estreia dia 16 de setembro na Mostra Competitiva do Festival de Brasília e segue para a Mostra Diálogo de Porto Alegre.

Mulher, negra e periférica, a diretora sempre sentiu na pele as dificuldades da vida na “quebrada”, assim como a solidariedade entre os moradores. Enquanto o resto da cidade simplesmente se recusa a reconhecer essas pessoas, limitando suas oportunidades e vendo-as apenas em papéis de servidão, os jovens que nascem e crescem à margem da sociedade tentam buscar alternativas e ir atrás de seus sonhos. Contudo, nunca é fácil. “O curta fala sobre como é pesado ser jovem negro na periferia, mas a gente sempre arruma um jeito de sobreviver e r(existir) de alguma forma”, explica Jéssica.

Peripatético acompanha alguns dias na vida de Simone, Thiana e Michel, moradores da periferia de São Paulo. Simone procura o primeiro emprego, Thiana tenta passar no vestibular de medicina e Michel ainda não sabe o que quer fazer de sua vida. A história se passa em maio de 2006, período no qual a capital paulista sofreu diversos ataques da facção criminosa PCC. O filme se inspirou na luta do movimento Mães de Maio, uma reação à violência contra inúmeros jovens inocentes que foram assassinados durante o conflito.

 

A diretora Jéssica Queiroz na última Semana de Cinema e Mercado da AIC, no Painel de Mulheres Cineastas. Foto: Alê Borges

O roteiro é de Ananda Radhika, que estudou com Jéssica no Instituto Criar. Por vários anos, a história ficou na gaveta, por falta de recursos para ser produzida. Em 2015, a diretora inscreveu o curta no Programa VAI (Valorização de Iniciativas Culturais), um edital da Prefeitura de São Paulo, e recebeu verba para realizá-lo. “Ainda assim, a grana foi pouca e tivemos muito aperto, mas a equipe era tão apaixonada pelo roteiro quanto eu”, conta. De acordo com a cineasta, mesmo tendo se passado mais de uma década desde os acontecimentos da história, a temática ainda é urgente. “Precisamos falar sobre o que está acontecendo no lado de cá da ponte. Muita coisa não mudou.”

A ficha técnica ainda conta com o professor de Direção de Arte da AIC, Dicezar Leandro, e os alunos Luiz Augusto Moura na Direção de Fotografia e Bianca Santos e Isadora Torres na Direção de Som.

A maior parte do filme foi rodada em Ermelino Matarazzo, zona leste de São Paulo. Para a diretora, gravar no “quintal de casa” acabou se mostrando uma experiência maravilhosa. “Foi uma semana de filmagem corrida, com chuva, muita chuva! A maior parte das cenas são externas e praticamente ficamos ilhados”, lembra. O que fez a diferença foi a força dada pelos pais e pela irmã, especialmente no preparo das refeições para a equipe. “Até tias e vizinhos vieram ajudar!”

Como o curta possui animações, o processo de pós-produção foi demorado e também muito trabalhoso. “Sem os parceiros, que apoiaram o projeto nessa etapa de finalização, não teríamos conseguido entregar o filme a tempo para o festival”, ressalta. Segundo Jéssica, a Produtora de Som Mugshot mixou e fez algumas trilhas e a Quanta Post foi responsável pelo DCP (arquivo final de vídeo e áudio para exibição).

Cena do filme Peripatético que estreia amanhã no Festival de Brasília. “Meus filmes têm muito de mim e de onde venho. Acredito que negros e periféricos precisam ser bem representados na tela, de uma forma positiva, para fazer com que as pessoas saibam que a periferia é um lugar possível”, diz Jéssica em entrevista para a AIC.

Com uma equipe majoritariamente feminina, a diretora buscou, em todos os momentos da produção, imprimir veracidade e autenticidade à história. Na direção de arte, o maior desafio foi escapar de cenografias muito caricatas, com “cara de novela”. Já na direção de fotografia, o conceito foi fugir da “estética da pobreza” e realizar um filme cheio de cor e vida.

Jéssica iniciou sua carreira com teatro e literatura, em um grupo dentro de sua escola, chamado Os Mesqueiteiros. Depois de participar de uma oficina de audiovisual ministrada por professores do Instituto Criar, ela se apaixonou pela sétima arte e seguiu se aperfeiçoando. “Fiz curso técnico em edição no Instituto e comecei a trabalhar com edição dentro de agências de publicidade. Passei pela Repense, Africa, e agora estou na Talent Marcel.”

Cursando o FILMWORKS – o curso técnico em direção cinematográfica da AIC, Jéssica foi diretora do documentário Vidas de Carolina. Como trabalho de conclusão, dirigiu o curta Número e Série, exibido no Pausa pro Café do Canal Brasil e selecionado para o Curta Cinema e o Festival Comunicurtas. “Meus filmes têm muito de mim e de onde venho. Acredito que negros e periféricos precisam ser bem representados na tela, de uma forma positiva, para fazer com que as pessoas saibam que a periferia é um lugar possível”, afirma a cineasta, cuja jornada em busca de representatividade está apenas começando.

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