O filme, escrito e dirigido pelo ex-aluno da AIC Cristiano Burlan, fez parte da seleção do festival É Tudo Verdade, no ano passado, tendo levado o prêmio de melhor filme pela ABD-SP (Associação Brasileira de Documentaristas) e o prêmio EDT (Associação de Profissionais de Edição Audiovisual) de melhor documentário. Além disso, o longa participou do Festival de Brasília e do DocMontevideo.
A “Trilogia do Luto” de Cristiano Burlan se iniciou em 2007, com o documentário Construção, em homenagem a seu pai, falecido de forma até hoje pouco esclarecida. O segundo filme foi o premiado Mataram meu Irmão (2013), em que o cineasta reconstituiu os detalhes do assassinato de seu irmão. A jornada pessoal de Burlan o levou ao coração de um círculo de violência em torno da periferia paulistana, onde morava com sua família. Em seu novo documentário, o diretor embarca rumo a Porto Alegre, entrevistando familiares e amigos para reconstituir parte da infância de sua mãe.
Uma das características do trabalho de Burlan é não tentar fugir do que há de mais dramático e emocionalmente intenso em sua própria existência. “Acredito que sempre fazemos cinema por uma perspectiva pessoal. Eu precisava encerrar esse ciclo de luto e tragédia familiar. Para isso, tinha duas saídas: vingar as mortes dos meus familiares ou fazer os filmes”, conta o diretor.
A necessidade de fechar essa trilogia também está relacionada à vontade de discutir sobre temas fundamentais e urgentes. “No caso do filme sobre minha mãe, esses temas são o feminicídio e a vulnerabilidade a que milhares de mulheres estão expostas dentro de suas casas”. Dados recentes apontam que o feminicídio cresceu exponencialmente nos primeiros meses de 2019, com mais de 100 casos consumados. “Por mais que tenhamos discutido sobre machismo e criado leis que amparam as mulheres, elas continuam sendo vítimas de seus companheiros e permanecem expostas a violências cotidianas”, ressalta Burlan, acrescentando que essa violência não pode ser legitimada.
O filme não trata apenas da mãe do cineasta, mas da jornada de um filho em busca da imagem perdida dessa mulher. “O luto costuma embaçar as minhas lembranças, apagar o rosto da memória. Durante o filme, resgatei os traços, o cheiro, o contorno da minha mãe. E também me encontrei. Descobri muito de mim nesse percurso. Para mim, o filme foi um reencontro”.
Segundo Burlan, os documentários não trazem resolução para seus traumas, nem solucionam seus problemas, tampouco apagam a dor da perda. “Não acredito que isso seja terapia, porque não me sinto melhor depois de realizar os filmes; ao contrário, o preço que pago é muito alto. Não saio ileso nesse processo: eu me julgo e me cobro, ética e esteticamente. Preciso realizar as obras e entender que elas não podem ser apenas sobre a minha história, mas que devem entrar em diálogo com outras histórias. Isso não é terapia”, ressalta.
Atualmente, Cristiano Bulan está em processo de finalização da série Paulo Freire, um Homem do Mundo, para o SescTV. Também trabalha na montagem de seu mais recente longa-metragem, Batalha, e está em fase de pré-produção do longa de ficção A Mãe, cujo roteiro assina com sua parceira criativa, Ana Carolina Marinho. O filme será protagonizado por Marcélia Cartaxo e contará com Helena Ignez e Osmar Prado no elenco.
Ficha técnica
Título: Elegia de um Crime
Duração: 92 minutos
Gênero: Documentário
Direção: Cristiano Burlan
Produzido por: Bela Filmes
Produção executiva: Priscila Portella, Bruno Caticha
Roteiro: Cristiano Burlan, Ana Carolina Marinho
Direção de fotografia: Cristiano Burlan, Renato Maia, Henrique Zanoni
Montagem: Cristiano Burlan, Renato Maia
Edição de som: Julia Teles, Vanessa Gusmão
Mixagem: Edson Secco
Finalização: Anti-glitch Foundation, Sonideria
Colorista: Lucas Negrão