‘Julie, Agosto e Setembro’ e a força do cinema Goiano
Primeiro filme dirigido e roteirizado por Jarleo Barbosa, ex-aluno do curso de Oficina Crítica da Academia Internacional de Cinema (AIC), Julie Agosto e Setembro já percorreu alguns dos principais festivais de cinema do país, entre eles: Gramado, Festival Internacional de SP, Festival Internacional de BH, Cine Ceará, Guarnicê, Curta Cinema do Rio e vários outros, além de duas exibições na Europa. Nesse percurso, desde quando foi lançado no ano passado, já acumulou 15 prêmios em diferentes categorias, tais como: Melhor Roteiro, Melhor Filme, Melhor Edição, Melhor Atriz, Melhor Direção, entre outros.
“Fico feliz de várias áreas do filme terem sido contempladas. Mas essa coisa de prêmio só significa algo num nível muito superficial. Especialmente na hora que você ganha, no dia. Depois, no outro dia, você tem que pagar conta do mesmo jeito, você tem as mesmas deficiências enquanto cineasta etc. Fico feliz pelos prêmios que recebi, mas acho que o valor do filme está em outros aspectos intrínsecos, como as relações que ele estabelece com o mundo. Essa coisa de premiação é sempre mediada por critérios e critérios muitas vezes arbitrários. Por exemplo, Cidadão Kane (de Orson Welles), em 1941, e Laranja Mecânica (de Stanley Kubrick), em 1971, não ganharam os Oscar de melhor filme. O que absolutamente não altera o status desses filmes de obras primas, né? “, explica Jarleo.
O filme conta a história de Julie, uma garota suíça que acabou de se mudar pra Goiânia. Pouco a pouco ela vai entendendo a cidade até, por fim, se transformar em uma parte dela. Para dar mais realismo ao roteiro, Jarleo optou por todos diálogos serem feitos em língua francesa. Segundo o diretor, ele falar principalmente sobre não se sentir parte, sobre se sentir alheio. Sobre uma falta de vínculo com um lugar e com as pessoas, apesar do esforço de estreitamento desses laços.
“Precisava ser outra língua porque eu queria acentuar essa coisa de se sentir estrangeiro. Eu precisava que as pessoas, ao assistirem o filme, sentissem um pouco dessa sensação da personagem de estar meio perdida. Porque nossa língua materna é uma zona de conforto. É uma coisa que te faz sentir em casa. Então eu queria isso: que personagem e público estivessem fora de casa.”, diz o diretor.
Nesta semana, na sexta, 07/12, às 20h, o Julie, Agosto e Setembro será exibido no 7º FAIA – Festival de Atibaia Internacional do Audiovisual, que acontece entre os dias 5 e 8 de dezembro. É o 42º festival do filme! E claro que nós da AIC estaremos torcendo para mais uma boa campanha!
Confira abaixo a entrevista exclusiva com o diretor Jarleo Barbosa e o trailer de Julie, Agosto e Setembro.
AIC – Como surgiu a ideia do filme?
Jarleo Barbosa – Surgiu de um teste de câmera. Meu amigo, o Emerson Maia, que também é diretor de fotografia do filme, tinha acabado de comprar uma câmera nova. E aí ele sugeriu que eu escrevesse um roteiro pra gente testar a câmera. Isso era uma terça. Na segunda seguinte a gente tava rodando o filme. Então não teve uma produção muito elaborada. A gente chamou uns amigos e rodamos. Eu não tinha ideia que o filme ia virar o que virou. Foi um filme independente mesmo, no sentido mais puro do termo. Tão puro que a gente nem usava esse termo ‘independente’. A gente queria fazer um filme, juntamos as forças e fizemos. Toda a equipe é de Goiás, de gente que mora ou morava lá.
AIC – Apesar de morar há dois anos em S. Paulo você é goiano da cidade de Anápolis. Foi lá em Goiás que nasceu essa identificação com o audiovisual? Como aconteceu?
Jarleo Barbosa – Apesar de na minha infância meus pais terem sidos donos de uma video-locadora, nunca pensei em fazer cinema. Foi totalmente por acaso que eu entrei na área. Eu queria ser psicólogo. Estudei pra isso no vestibular e cheguei a começar o curso. Mas quando abriu o curso de Rádio e TV na UEG (Universidade Estadual de Goiás), eu me interessei, prestei o vestibular e passei. Só que ao fazer a matrícula descobri que o curso tinha passado por uma mudança na grade e não seria mais Radio e TV e sim Audiovisual. Com isso o cinema entrou mais forte na ementa. Então isso me aproximou do cinema. Eu comecei a trabalhar com cinema ainda na faculdade, em 2008, na área de som. Fiz muitos filmes nesse departamento. Só com o Julie que passei pra direção e roteiro.
AIC – Logo depois, em 2010, você já fundou a sua produtora, a Panaceia Filmes, né? Como é viver de cinema fora do eixo Rio-São Paulo, onde estão os maiores investimentos na área?
Jarleo Barbosa – Sim. A Panaceia surgiu antes de eu entrar na AIC, em 2011. A produtora surgiu em 2010. Ela é formada por 4 sócios que são egressos do primeiro curso de audiovisual da UEG, todos da primeira turma formada em audiovisual no estado. Atualmente nós estamos nesse desafio de viver de cinema em Goiás. Como qualquer outra área de trabalho, pra se viver de cinema é preciso diversificar os negócios. Então nós vivemos de cinema, mas em vários níveis. Além dos filmes que fazemos, seis até agora, temos uma revista de cinema: a Janela; realizamos também uma mostra nas ruas de Goiânia chamada Cinema na Calçada; e estamos desenvolvendo um guia de distribuição de filmes, além de outros projetos. Tudo através de edital público com parceria com a iniciativa privada.
AIC – Como é o mercado de cinema em Goiás?
Jarleo Barbosa – O cinema em Goiás é incipiente, mas está em franco crescimento. Ainda que questionáveis, temos editais de fomento tanto em nível estadual quanto municipal. Existem festivais de cinema, como o FICA (Festival Internacional de Cinema Ambiental) o FESTCINE Goiânia e o Goiânia Mostra Curtas. Além disso, temos curso de graduação e pós-graduação na área. Ou seja, estamos criando uma cultura de cinema lá. Existe uma nova safra de críticos, o que é super importante pra refletir nossa própria produção. Nossos filmes estão cada vez mais percorrendo os festivais e o mercado tem se profissionalizado. Mas ainda é aquela penúria de se fazer cinema fora do eixo Rio/SP. Coisa que só que quem tá fora do eixo entende.
AIC – Quais teus futuros projetos para o Julie e para tua carreira cinematográfica?
Jarleo Barbosa – Existe um projeto para o filme virar uma espécie de série pra TV. Talvez aconteça, mas minha vontade é de contar outras histórias, fazer outras coisas. Fora isso, estou finalizando meu novo filme que se chama ‘Atrás da história (ou No coração do filme)’ – veja abaixo o making of, com a equipe da Panaceia Filmes em ação. O lançamento está previsto pro início de 2013. Vai ser o primeiro filme da produtora finalizado em 35mm. Eu também continuo como diretor da revista JANELA e trabalhando nos outros projetos e filmes da Panaceia Filmes, em diversas funções.
AIC – Como o curso que você fez na AIC contribuiu para sua profissão de diretor de cinema?
Jarleo Barbosa – Pra mim foi importante fazer o curso de Oficina Crítica da AIC, com o professor Franthiesco Ballerini porque tive acesso a uma reflexão que antes não fazia parte do meu repertório. Então foi um abrir de portas mesmo. Foi importante porque eu me interesso por arte e crítica de uma maneira geral. E o cinema é uma arte sincrética, que mistura várias outras manifestações artísticas. Então ter um curso de crítica de arte foi importante pra entender melhor o cinema nesse seu caráter híbrido.
Trailer de Julie, Agosto e Setembro
Making of de Atrás da história (ou No coração do filme)
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FICHA TÉCNICA
Elenco: Carolina Provázio, Allan Santana, Rodrigo Scaliante, Rômulo Dias; Voz Julie: Meige Laurent; Direção e roteiro: Jarleo Barbosa; Assistente de direção: Osvaldo Lélis; Direção de produção: Larissa Fernandes; Assistente de produção: Jean Lélis, Rômulo Dias e Rodrigo Scaliante; Direção de fotografia: Emerson Maia; Assistente de câmera: Kaco Olímpio; Direção de arte: Benedito Ferreira; Edição de som: Thaís Oliveira; Edição: Pedro Novaes; Maquiagem: Paulo Lopes; Gravação de off: Leo Vassoura; Still: Kai Labre; Trilha sonora: Victor Pontes; Música: Folk Heart; Projeto gráfico: Adriano Venâncio
Créditos:
Reportagem e edição: Paulo Castilho.
Fotos: divulgação.