“Sabe quando Hollywood produz um grande blockbuster que realmente envolve você em um mundo e faz acreditar em coisas extraordinárias que te tocam de uma forma quase lírica? É quando eu mais me divirto no cinema.” Christopher Nolan
O que é?
Embora os irmãos franceses Auguste e Louis Lumière sejam considerados os “pais” do cinema moderno, por terem inventado o cinematógrafo nos anos 1890, foi o cinema norte-americano (ou hollywoodiano) que transformou a arte em indústria, tendo se tornado a força dominante nesse sentido, desde o início do século 20. A média de longas-metragens produzidos anualmente nos Estados Unidos é de 800 filmes, um número significativo – como comparação, o Brasil produziu em 2017 um recorde de 143 longas.
O quartel general da indústria cinematográfica americana, desde o início do século passado, tem sido a região de Hollywood, na cidade de Los Angeles, estado da Califórnia. Seus grandes estúdios são responsáveis por alguns dos maiores sucessos comerciais do cinema mundial, entre eles:
- O Nascimento de uma Nação / The Birth of a Nation (1915),
- E o Vento Levou / Gone with the Wind (1939),
- A Noviça Rebelde / The Sound of Music (1965),
- A trilogia O Poderoso Chefão / The Godfather (1972),
- Tubarão /Jaws (1975),
- A saga Star Wars (1977),
- E.T. O Extra-Terrestre / E.T. the Extra-Terrestrial (1982),
- Jurassic Park (1993),
- Titanic (1997),
- e Avatar (2009).
O cinema hollywoodiano teve e ainda tem enorme influência na indústria cinematográfica do mundo inteiro – especialmente no Brasil, onde os filmes de Hollywood lotam as salas de exibição. Enquanto muitas produções nacionais estreiam com uma ou duas cópias, alguns blockbusters chegam a ter mais de cem, além de todo o investimento em publicidade com o qual esses longas podem contar.
O estilo mais conhecido do cinema americano é o clássico, que se desenvolveu de 1917 a 1960 e ajudou a estabelecer a linguagem cinematográfica usada pela maioria dos filmes que ainda são produzidos atualmente. Hollywood também é considerada o berço de diversos gêneros cinematográficos, como os filmes de ação, os musicais, comédias, dramas, filmes de terror, ficção científica e épicos de guerra. Além disso, a indústria é pioneira em inovações tecnológicas relacionadas à produção e pós-produção, apostando alto em efeitos especiais e todo tipo de atrativo visual para encantar o público.
Um pouco de história
As origens do cinema norte-americano estão ligadas ao próprio nascimento da sétima arte. Antes dos irmãos Lumière, em 1872, Eadweard Muybridge fez um experimento fotográfico em Palo Alto, na Califórnia, para capturar uma série de imagens reproduzindo a cena de um cavalo correndo. A partir disso, diversos inventores tentaram criar dispositivos para gravar imagens em movimento. Nos Estados Unidos, um dos primeiros a ser bem-sucedido nessa empreitada foi Thomas Edison, que se baseou nas descobertas da época para desenvolver o chamado cinescópio ou cinetoscópio (kinetoscope), uma caixa com imagens filmadas em seu interior, em 1891.
A história da indústria cinematográfica dos Estados Unidos se iniciou na costa leste do país. Entre os anos 1910 e 1920, a cidade de Fort Lee, em Nova Jersey, era a mais importante em termos de produção. Foi Edison quem deu o pontapé inicial para a comercialização do cinema, com a empresa cinematográfica Black Maria. As cidades que se situavam às margens do Rio Hudson tinham muitas terras disponíveis e o custo de produção era mais barato do que em Nova York, o que resultou em um período de crescimento para aquela região.
O estado da Flórida também foi cotado para sediar estúdios, mas as condições climáticas (principalmente furacões) desmotivaram os investidores. Outros grandes centros de produção cinematográfica, na época, incluíam a cidade de Chicago e o estado do Texas – além, é claro, da Califórnia, onde a indústria já começava a se firmar.
A região de Hollywood, na Califórnia, foi incorporada como municipalidade em 1903. Em 1910, o conselho municipal votou por unir o distrito a Los Angeles (do espanhol los ángeles, literalmente “os anjos”, hoje a segunda cidade mais populosa dos Estados Unidos). Essa união teve o propósito de garantir que Hollywood tivesse um abastecimento de água adequado e pudesse ter acesso ao sistema de esgoto de Los Angeles.
O primeiro estúdio de cinema de Hollywood foi a Nestor Motion Picture Company, inaugurada em 1911. Naquela época, a maior parte das patentes dos equipamentos e processos cinematográficos pertencia à Motion Picture Patents Company, de Nova Jersey, empresa comandada por Thomas Edison. Para não serem processados ou terem suas câmeras apreendidas por Edison, muitos cineastas acabaram se deslocando para a costa oeste do país, onde poderiam burlar mais facilmente as leis referentes à patente. Além disso, o clima ameno e ensolarado da região era ideal para filmagens externas durante o ano inteiro. As paisagens planas e montanhosas, com uma grande variedade de cenários, também contribuíram para impulsionar a produção cinematográfica local.
O primeiro cineasta a fazer um filme em Hollywood foi D. W. Griffith, com o curta-metragem In Old California (1910). Curiosamente, nesse período, Hollywood (que ainda era um distrito à parte de Los Angeles) havia banido salas de exibição de filmes. No entanto, em 1912, diversas grandes empresas produtoras já haviam se estabelecido na região, incluindo a Paramount, Warner Bros., RKO e Columbia.
Na década de 1920, Hollywood era a quinta maior indústria cinematográfica dos Estados Unidos. Em 1923, um enorme letreiro com a palavra HOLLYWOODLAND foi instalado no alto de Hollywood Hills, para anunciar um projeto imobiliário. O marco foi restaurado em 1949, porém removidas as letras “LAND”, para que o letreiro passasse a se referir somente ao distrito, não ao empreendimento. Já em 1929, foi realizada em Hollywood a primeira cerimônia de entrega do Oscar, até o presente a principal e mais respeitada premiação da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos Estados Unidos.
Nos anos 1930, os estúdios hollywoodianos passaram a integrar os processos de produção, distribuição e exibição, permitindo que fossem lançados um expressivo número de 600 filmes por ano, o que finalmente transformou Los Angeles na capital do cinema norte-americano. Desde então, Hollywood tem sido conhecida como a “fábrica de sonhos” ou Tinseltown (“cidade de latão”, em referência a algo que tem brilho falso, imitando ouro).
Em meados dos anos 1950, foi construída a Hollywood Freeway, ainda hoje uma das mais importantes e movimentadas avenidas de Los Angeles. A popular Calçada da Fama de Hollywood foi inaugurada em 1960, para homenagear os artistas e colaboradores da indústria do entretenimento. Com o passar das décadas, Los Angeles cresceu ainda mais, recebendo profissionais do audiovisual em busca de sucesso e estrelato, muitos dos quais podiam se dar por satisfeitos quando conseguiam pagar o aluguel.
“Na Europa, um ator é um artista. Em Hollywood, se ele não está trabalhando, é um mendigo”, afirmou o ator Anthony Quinn.
Hollywood passou por um período menos glamoroso após os anos 1960, com o final de sua Era de Ouro. Durante as décadas de 1980 e 1990, passou pela explosão dos blockbusters. Desde 2000, o distrito tem passado por uma revitalização promovida por empresas privadas e o poder público. Em 2001, foi inaugurado o Dolby Theatre, local onde atualmente é realizada a cerimônia de entrega dos Oscars. Em 2002, alguns moradores iniciaram uma campanha para separar Hollywood de Los Angeles novamente, porém a sugestão foi desaprovada pela maioria dos votos da população.
Principais cineastas e filmes
Uma das primeiras produções norte-americanas a obter destaque foi O Grande Roubo do Trem / The Great Train Robbery (1903), também considerado o primeiro western já produzido. Entre os cineastas mais importantes, certamente um dos maiores pioneiros foi D. W. Griffith, que revolucionou o cinema nos Estados Unidos com o desenvolvimento de uma nova sintaxe cinematográfica. Seu controverso épico O Nascimento de uma Nação (1915), que usava técnicas de montagem extremamente inovadoras para a época, foi produzido com apenas 61 mil dólares e é considerado o filme mais lucrativo de todos os tempos, tendo obtido mais de 10 milhões de dólares.
Em 1910, Griffith e sua trupe de atores (que incluía Blanche Sweet, Lillian Gish, Mary Pickford e Lionel Barrymore) passaram a utilizar um terreno baldio em Los Angeles para suas produções. Aventurando-se em busca de novas locações, a equipe acabou encontrando Hollywood, na época um pequeno vilarejo muito hospitaleiro a filmagens. Foi ali que o diretor filmou seu curta-metragem In Old California, antes de retornar a Nova York.
Ainda no início do século 20, quando o cinema era uma novidade, muitos imigrantes judeus acabaram buscando empregos nessa indústria, vendo nela uma possibilidade lucrativa de negócio. Homens que, posteriormente, tornaram-se verdadeiros magnatas, como Samuel Goldwyn, William Fox, Carl Laemmle, Adolph Zukor, Louis B. Mayer e os irmãos Warner (Harry, Albert, Samuel e Jack), precursores da criação daqueles que seriam os maiores estúdios norte-americanos. Uma mulher também se destacou nos primórdios da indústria: a diretora, produtora e empresária Alice Guy-Blaché.
Charles Spencer Chaplin, ou Charlie Chaplin, foi um dos expoentes do cinema silencioso norte-americano. Embora suas origens fossem britânicas, o cineasta e comediante filmou grande parte de sua produção na Califórnia (onde possuía um estúdio), incluindo clássicos como O Garoto / The Kid (1921), Em Busca do Ouro / The Gold Rush (1925), Luzes da Cidade / City Lights (1931) e Os Tempos Modernos / Modern Times (1936). Seu personagem mais icônico, o Vagabundo (The Tramp), marcou a história do cinema, em uma carreira que se estendeu por mais de 75 anos.
O Cantor de Jazz / The Jazz Singer (1927), de Alan Crosland, foi o primeiro filme a usar vozes sincronizadas e também o primeiro do gênero musical, dando início à era dos talkies (filmes falados) nos Estados Unidos. A partir de então, diversas empresas de Hollywood passaram a utilizar a tecnologia Vitaphone em suas produções, fazendo com que diversos atores populares do cinema mudo perdessem seus empregos – já que, muitas vezes, eles não tinham boas vozes ou não eram capazes de memorizar suas falas.
Os primeiros filmes norte-americanos falados acabaram enfrentando certa rejeição no mercado internacional, até mesmo em países cuja língua era o inglês. Também não era possível dublar os filmes em outros idiomas porque a tecnologia de sincronização ainda era muito primitiva. Uma das soluções foi regravar as mesmas histórias em versões paralelas, com atores estrangeiros e orçamentos mais reduzidos, para lançar em outros países; contudo, por sua má qualidade, essas produções não fizeram muito sucesso.
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A Era Clássica (1917 a 1960), Studio System e Star System
A chamada Era Clássica ou Era de Ouro do cinema norte-americano abrangeu o período de 1917 a 1960. O Cantor de Jazz marcou seu início, com o aumento dos lucros provocado pela chegada dos longas-metragens sonoros. Nesse período, a maioria dos estúdios aderiu a fórmulas de sucesso: westerns, comédias pastelão, musicais, desenhos animados e filmes biográficos. Além disso, era comum que as equipes criativas por trás dos filmes trabalhassem frequentemente para os mesmos estúdios – por exemplo, o compositor Alfred Newman foi contratado pela 20th Century Fox durante vinte anos e o diretor Cecil B. De Mille produziu quase todos os seus filmes pela Paramount. O mesmo acontecia com os atores: a MGM se vangloriava por ter em sua folha de pagamento “mais estrelas do que havia no céu”.
O chamado studio system (“sistema de estúdios”) foi a base da indústria cinematográfica durante quatro décadas. Os principais estúdios contavam com milhares de profissionais fixos – atores, diretores, produtores, roteiristas, técnicos e até mesmo dublês. As mesmas empresas também eram proprietárias de inúmeras salas de cinema, que exibiam seus próprios filmes e tinham uma demanda constante por novidades. Na época, os maiores estúdios, conhecidos como The Big Five, eram a 20th Century Fox, RKO Pictures, Paramount Pictures, Warner Bros. e Metro-Goldwyn-Mayer (ou MGM). The Little Three, ou “os três menores”, eram a Universal Studios, United Artists e Columbia Pictures.
Ao longo dos anos 1930, a MGM dominou as telas de cinema, além de ser a contratante das maiores estrelas de Hollywood. O estúdio foi um dos principais responsáveis pela criação do chamado star system (“sistema de estrelas”). O método de produção da época foi marcado pela promoção quase forçada de atores hollywoodianos ao estrelato. Os estúdios selecionavam jovens com potencial para se tornarem estrelas e os “moldavam” para personificar o glamour de Hollywood, criando novas personalidades para eles, às vezes até inventando nomes e histórias de vida. Exemplos de atores que passaram por isso incluem Cary Grant (cujo verdadeiro nome era Archie Leach), Joan Crawford (Lucille Fay LeSueur) e Rock Hudson (Roy Harold Scherer, Jr.), além de Clark Gable, Lionel Barrymore, Jean Harlow, Norma Shearer, Greta Garbo, Jeanette MacDonald e seu marido Gene Raymond, Spencer Tracy, Judy Garland e Gene Kelly.
O foco desse sistema estava na imagem dos atores, não na atuação – as mulheres deviam se portar como damas, nunca saindo de casa sem maquiagem ou malvestidas, e os homens precisavam ser vistos como cavalheiros. Uma das grandes estrelas dos anos 1940, Marilyn Monroe, chegou a observar que Hollywood era “um lugar onde se pagava mil dólares por um beijo e cinquenta centavos pela sua alma”.
Outra inovação do cinema norte-americano dessa época foi a empresa de Walt Disney, pioneira na área de animações, com grandes sucessos que deram origem a um verdadeiro império abrangendo vários países. Em 1937, Disney criou o mais bem-sucedido desenho animado de todos os tempos, Branca de Neve e os Sete Anões / Snow White and the Seven Dwarfs, longa com tecnologias de animação impressionantes, que deu a largada para uma série de filmes de fantasia protagonizados por princesas, os quais moldaram a infância de inúmeras crianças no mundo todo.
O ápice do studio system em Hollywood foi o ano de 1939, no qual foram lançados sucessos como O Mágico de Oz / The Wizard of Oz, E o Vento Levou / Gone with the Wind e No Tempo das Digilências / Stagecoach. No auge da popularidade dos filmes hollywoodianos, eram produzidos cerca de 400 longas por ano, com um público de 90 milhões de espectadores todas as semanas, somente nos Estados Unidos. Outros clássicos da Era de Ouro incluem a primeira versão para o cinema de:
- King Kong (1933),
- Aconteceu Naquela Noite / It Happened One Night (1934),
- O Grande Motim / Mutiny on the Bounty (1935),
- O Picolino / Top Hat (1935),
- Casablanca (1942),
- A Felicidade Não Se Compra / It’s a Wonderful Life (1946),
- A Dama de Shanghai / The Lady from Shanghai (1947),
- Rio Vermelho / Red River (1948),
- Janela Indiscreta / Rear Window (1954),
- Sindicato de Ladrões / On the Waterfront (1954),
- Juventude Transviada / Rebel Without a Cause (1955),
- Quanto Mais Quente Melhor / Some Like It Hot (1959)
- Sob o Domínio do Mal / The Manchurian Candidate (1962).
Entre as principais estrelas da Era Clássica de Hollywood, além dos já citados, estiveram Humphrey Bogart, Lauren Bacall, Katharine Hepburn, Fred Astaire, Ginger Rogers, Marlon Brando, John Wayne, James Stewart, Buster Keaton, Claudette Colbert, Burt Lancaster, Gregory Peck, Elizabeth Taylor, Kirk Douglas, Bette Davis, Audrey Hepburn, Grace Kelly, Laurence Olivier, Marlene Dietrich, James Cagney, Ava Gardner, Ingrid Bergman, Henry Fonda, Marilyn Monroe, James Dean, Mae West, William Holden, Sophia Loren, Vivien Leigh, Joan Fontaine, Gary Cooper, Shirley Temple, Janet Leigh, Charlton Heston, Rita Hayworth e Mary Pickford.
Embora a Era de Ouro de Hollywood tenha sido um período de regras rígidas para a produção cinematográfica, algumas das maiores obras de arte do cinema norte-americano foram realizadas nessa época, inclusive Cidadão Kane / Citizen Kane (1941), dirigido por Orson Welles e considerado por muitos como o melhor filme da história. Isso se deve ao fato de que, com tantos longas sendo lançados, os estúdios podiam se dar ao luxo de apostar em obras mais arriscadas e artísticas, de orçamento médio, com bons roteiros e atores não tão famosos. Outros exemplos que se encaixam nessa descrição são os filmes de Howard Hawks, Alfred Hitchcock e Frank Capra, cineastas de temperamento forte que lutavam para manter a liberdade criativa frente aos estúdios.
O declínio do studio system e, consequentemente, da Era de Ouro de Hollywood, iniciou-se no final dos anos 1940. O primeiro fator que prejudicou a indústria foi um ato federal (o chamado Anti-Trust Act), que separou os processos de produção e de exibição dos filmes, o que obrigou as salas de exibição a ampliarem seu leque de filmes e acabou com os monopólios dos grandes estúdios, os quais também foram obrigados a finalizar os contratos com seus atores e técnicos fixos. Isso que provocou uma mudança de paradigmas no aspecto criativo, já que as equipes eram inteiramente diferentes a cada novo filme.
O segundo fator que contribuiu para o fim dessa era foi a chegada da televisão. A novidade mudou a maneira como os filmes norte-americanos, particularmente os hollywoodianos, eram produzidos, já que levou os estúdios a uma nova estratégia de investimento: eles passaram a bancar menos produções por ano, mas com orçamentos maiores, com o objetivo de oferecer opções de entretenimento grandiosas que pudessem competir com a televisão. Desse modo, apostou-se em histórias visualmente espetaculares e épicas.
A Era pós-clássica (1960 a 1980)
A Nova Hollywood, que se iniciou nos anos 1960 e durou até os anos 1980, tem como principal nome Steven Spielberg, que se tornou um dos diretores e produtores mais populares da história do cinema mundial. Essa era “pós-clássica” trouxe mudanças na maneira de contar histórias, com novas abordagens para a construção narrativa e para a caracterização dos personagens – como cronologia não linear, ambiguidade moral entre o protagonista e o antagonista, além dos chamados “twist endings” (reviravoltas surpreendentes, em geral reveladas no final do filme, inspiradas no gênero film noir).
Esse período fez surgir uma nova geração de cineastas que haviam passado por escolas de cinema e que conheciam as técnicas e os movimentos cinematográficos desenvolvidos na Europa nas décadas anteriores (como o Neorrealismo Italiano e a Nouvelle Vague Francesa). O filme Bonnie e Clyde: Uma Rajada de Balas / Bonnie and Clyde (1967), de Arthur Penn, marcou o renascimento do cinema hollywoodiano, principalmente nas bilheterias. Sem Destino / Easy Rider (1969) foi outro grande sucesso, de orçamento relativamente baixo, com heróis imorais e uma boa dose de sexualidade e violência.
Cineastas que até hoje são reverenciados, como Francis Ford Coppola, Steven Spielberg, George Lucas, Brian De Palma, Stanley Kubrick, Martin Scorsese, Roman Polanski e William Friedkin, muitos dos quais continuam atuando na indústria, passaram a produzir obras que homenageavam a história do cinema e traziam referências de gêneros e técnicas desenvolvidos pelos filmes clássicos. Por conta disso, os longas produzidos nos anos 1970 por esses diretores foram aclamados pela crítica, ao mesmo tempo em que encontraram uma boa recepção junto ao público.
O advento da era dos blockbusters modernos veio com o sucesso estrondoso de filmes como 2001:
- Uma Odisseia no Espaço / 2001: A Space Odyssey (1968), de Kubrick;
- Taxi Driver (1972), de Scorsese;
- O Poderoso Chefão / The Godfather (1972) e Apocalypse Now (1979), de Coppola;
- O Exorcista / The Exorcist (1973), de Friedkin;
- Loucuras de Verão / American Graffiti (1973) e Guerra nas Estrelas / Star Wars (1977), de Lucas;
- Chinatown (1974), de Polanski; e Tubarão / Jaws (1975), de Spielberg.
Embora os jovens diretores tivessem o péssimo hábito de estourar prazos e orçamentos, os estúdios estavam em busca de novos hits e muitas vezes gastavam até mais do que podiam – como a United Artists, que faliu durante a produção de Portal do Paraíso / Heaven’s Gate (1980), de Michael Cimino. A frase do produtor Byron Allen ilustra bem esse período:
“Hollywood é um casino. Você tem que colocar suas fichas na mesa e esperar pelo melhor.” – Byron Allen
O mercado do Home Video, DVDs e Streaming (1980 até os dias de hoje)
Os anos 1980 e 1990 trouxeram o mercado do home video, ou seja, as pessoas passaram a alugar ou comprar filmes para assistir em casa. Ao mesmo tempo em que as vendas de ingressos para as salas de cinema sofreram um impacto, os estúdios vislumbraram a possibilidade de novos negócios. Outra característica desse período foi uma nova geração de cineastas, com acesso a fitas VHS e câmeras de vídeo, que passou a realizar filmes com pouquíssimo dinheiro. Os baixos custos de produção e as novas tecnologias provocaram uma explosão de longas independentes no cinema norte-americano, permitindo a ascensão de cineastas que não estavam sujeitos à aprovação de grandes estúdios para concretizarem suas ideias.
Entre os destaques dessa geração estão Quentin Tarantino, Robert Rodriguez, Paul Thomas Anderson, Spike Lee, Steven Soderbergh e Kevin Smith. Por terem acesso a inúmeros lançamentos e clássicos em vídeo, os diretores colocavam em suas obras uma quantidade enorme de referências e conexões a outros filmes. Seu estilo era inovador e irreverente, com elementos da cultura pop. Os videoclipes que eram lançados nos canais jovens de televisão, com seus cortes rápidos e ritmo frenético, também influenciaram a linguagem cinematográfica da época, especialmente a montagem.
Com a popularização dos DVDs, no início do século 21, esse tipo de mídia se tornou mais interessante e rentável para os estúdios, já que permitia a inserção de material extra, cenas cortadas e comentários da equipe. Nesse contexto, enquanto o cinema independente prosperava, Hollywood apostou nos heróis de ação dos blockbusters, com atores famosos como Sylvester Stallone, Arnold Schwarzenegger, Bruce Willis, Steven Seagal, Jean-Claude Van Damme, Wesley Snipes e Jackie Chan. Essa necessidade de atrair o público com grandes espetáculos permanece até os dias de hoje, principalmente com a popularização das mídias digitais e dos serviços de streaming.
Alguns dos filmes hollywoodianos que marcaram os anos 1980 foram:
- Os Caçadores da Arca Perdida / Raiders of the Lost Ark (1981),
- E.T. O Extra Terrestre / E.T. The Extra-Terrestrial (1982),
- Blade Runner: O Caçador de Androides / Blade Runner (1982), Scarface (1983),
- Os Caça-Fantasmas / Ghostbusters (1984),
- O Exterminador do Futuro / The Terminator (1984),
- Um Tira da Pesada / Beverly Hills Cop (1984),
- Os Goonies / The Goonies (1985),
- De Volta Para o Futuro / Back to the Future (1985),
- Top Gun: Ases Indomáveis / Top Gun (1986),
- Aliens: O Resgate / Aliens (1986),
- Máquina Mortífera / Lethal Weapon (1987),
- Atração Fatal / Fatal Attraction (1987),
- Wall Street: Poder e Cobiça / Wall Street (1987),
- Rain Man (1988),
- Duro de Matar / Die Hard (1988)
- e Conduzindo Miss Daisy / Driving Miss Daisy (1989).
Entre os filmes norte-americanos mais populares dos anos 1990 estão:
- Dança com Lobos / Dances with Wolves (1990),
- Os Bons Companheiros / Goodfellas (1990),
- Thelma & Louise (1991),
- O Silêncio dos Inocentes / The Silence of the Lambs (1991),
- O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final / Terminator 2: Judgment Day (1991),
- Os Imperdoáveis / Unforgiven (1992),
- O Guarda-Costas / The Bodyguard (1992),
- O Fugitivo / The Fugitive (1993),
- O Parque dos Dinossauros / Jurassic Park (1993),
- A Lista de Schindler / Schindler’s List (1993),
- Forrest Gump: O Contador de Histórias / Forrest Gump (1994),
- Pulp Fiction (1995),
- Seven: Os Sete Crimes Capitais / Se7en (1995),
- Coração Valente / Braveheart (1995),
- Titanic (1997),
- O Clube da Luta / Fight Club (1999),
- Matrix / The Matrix (1999),
- O Sexto Sentido / The Sixth Sense (1999)
- Beleza Americana / American Beauty (1999).
Os anos 2000 vieram com a febre de grandes franquias, muitas vezes inspiradas em séries de livros cultuadas por milhares de fãs, como as sagas Harry Potter e O Senhor dos Anéis / The Lord of the Rings. As franquias Piratas do Caribe / Pirates of the Caribbean e suas sequências, assim como as continuações de Guerra nas Estrelas / Star Wars também tiveram bilheterias consideráveis.
Batman: O Cavaleiro das Trevas / The Dark Knight ressuscitou os filmes de super-heróis inspirados em quadrinhos e, desde então, a batalha Marvel versus DC leva bilhões de pessoas às salas de cinema todos os anos. Para colocar os valores em perspectiva, no ano passado a venda de ingressos para filmes hollywoodianos superou a marca de 10 bilhões de dólares.
Recentemente, os serviços de streaming como Netflix e Amazon abriram um novo nicho de mercado, principalmente para o cinema independente. Esses filmes de menores orçamentos e realizados fora do universo mainstream hollywoodiano enfatizam elementos como a direção e o roteiro, com foco em soluções criativas e inovadoras para compensar a falta de recursos. Algumas produções desse tipo têm recebido reconhecimento de público e crítica, com destaque para documentários e filmes mais experimentais.
Principais características estéticas
O cinema hollywoodiano sempre se caracterizou por suas motivações mercadológicas e políticas. Desde os anos 1930, quando o presidente Roosevelt usou grandes astros de Hollywood para uma campanha do governo, os Estados Unidos utilizam sua maior ferramenta de comunicação e influência para disseminar seu modo de vida e de pensamento. O glamour hollywoodiano também foi muito usado para endossar produtos, que eram considerados objetos de desejo quando vistos nas mãos de atores famosos – a indústria do tabaco, por exemplo, muito se beneficiou desse tipo de visibilidade.
Aos poucos, conforme os antigos magnatas de Hollywood foram sendo substituídos por uma geração mais jovem, as ideias liberais ganharam força no cinema norte-americano; substituindo o conservadorismo que, nos velhos tempos, era reforçado pela censura. Os filmes passaram a ser mais inclusivos e os profissionais têm se preocupado com questões de gênero e representatividade – na frente das câmeras e dentro do set. No entanto, a indústria ainda é muito criticada por continuar sendo essencialmente machista, racista, fixada em juventude e padrões de beleza, muito mais preocupada com dinheiro e poder do que com o aspecto criativo ou artístico do cinema.
Esteticamente, a linguagem dos filmes norte-americanos sofreu diversas mudanças neste século de existência do cinema. No entanto, algumas particularidades dos filmes clássicos podem ser percebidas até os dias de hoje, como a preferência por narrativas tradicionais e diretas (que passam longe da experimentação) e com uma jornada do herói bem delineada, focando em personagens que possam gerar identificação com o público – principalmente masculino. As superproduções, carregadas de efeitos especiais e diversos cenários, privilegiando a ação e a aventura, também são características desse cinema. Com relação às temáticas, há uma preferência por fantasiar a realidade, com foco no individualismo e na manipulação das emoções. Esse padrão de referência hollywoodiano, por ser tão disseminado no mundo inteiro, acaba gerando certo desconforto no espectador quando ele se depara com outras estéticas, mais complexas, que apresentem narrativas lentas ou com maior subjetividade.
Legado para o cinema
O legado de Hollywood se torna evidente na forma como o cinema norte-americano se espalhou pelo mundo, estabelecendo um modo de produção industrial para a sétima arte. Independentemente de seus méritos ou falhas, esse cinema está presente de maneira massiva no repertório e na memória afetiva de boa parte dos cinéfilos, inclusive no Brasil. É quase impossível encontrar uma pessoa que não possa citar o nome de um filme ou ator norte-americano.
Essa dominação mundial se iniciou em 1912, quando as empresas produtoras competiam pelo mercado doméstico, que se encontrava em expansão devido à popularidade do sistema nickelodeon (uma das primeiras formas de exibição de filmes, em que pequenos espaços, geralmente em lojas, eram disponibilizados como salas de cinema ao preço de cinco centavos – ou seja, um níquel – por pessoa). Os estúdios compreenderam que seria possível expandir ainda mais esse negócio, exportando filmes para suas próprias filiais distribuidoras na Europa.
A distribuição de filmes norte-americanos no mercado estrangeiro permaneceu constante nas décadas que se seguiram. A Inglaterra foi um dos países que enfraqueceu sua própria produção nacional porque importava de maneira significativa os longas dos Estados Unidos. Nos primórdios de Hollywood, de 60% a 70% dos filmes que os ingleses assistiam eram americanos. Outros países que procuravam muito esse cinema eram a Alemanha, a Austrália e a Nova Zelândia.
Com a crescente globalização, o governo norte-americano passou a intensificar sua política de exportação de filmes, vendo no cinema um produto para expandir sua hegemonia – tanto econômica quanto cultural. Os Estados Unidos possuem o maior mercado interno de espectadores de filmes do mundo, mas o que favorece seu sucesso é o apelo universal de seus produtos, que apelam para o entretenimento, além do fato de que o inglês é considerado uma língua muito aceita e conhecida nos mais diversos países.
Com a ascensão da China na economia mundial, Hollywood buscou abarcar também esse nicho de consumidores. Para tanto, os estúdios que pretendiam distribuir seus filmes no país tiveram que ceder às pressões da censura e passaram a evitar temas como “fantasmas, violência, assassinatos, terror ou demônios”. Todos os longas exibidos no país precisam ser aprovados pelos censores e dublados em chinês.
No Brasil, de acordo com o Anuário Estatístico do Cinema Brasileiro do ano passado (ANCINE, 2017), entre os vinte títulos de maior bilheteria, dezenove eram produções norte-americanas e apenas uma brasileira (Minha Mãe é uma Peça 2, que ficou em 9o lugar). Segundo a mesma pesquisa, em 2017 foram lançados 463 títulos no Brasil, sendo 160 brasileiros. Entre esses filmes, 34,6% eram brasileiros, 27,6% norte-americanos e 37,8% eram de outras nacionalidades. No entanto, vale ressaltar que o número de cópias das produções norte-americanas em geral é significativamente maior do que das nacionais, graças ao poder das seis principais distribuidoras internacionais no país – Fox, Disney, Warner, Paramount, Sony e Universal. Outro detalhe que diz muito sobre a influência hollywoodiana é o percentual de público dos filmes lançados: de um público de 181,2 milhões de espectadores, 85,1% optaram por produções dos Estados Unidos, 8% por filmes de outros países e apenas 6,9% por filmes brasileiros.
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*Texto e Pesquisa: Katia Kreutz. Fotos divulgação.