Dirigir atores para o cinema é uma das grandes tarefas do Diretor de Cena. Confira o artigo escrito pelo diretor Cristiano Burlan, para a Revista Zoom (ed. 144) e entenda um pouquinho mais sobre essa técnica.
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O cinema como meio de expressão é uma arte embrionária, contando com pouco mais de um centenário de história. As possibilidades técnicas e estilísticas são inúmeras, assim como os muitos caminhos a se percorrer. O trabalho com o ator se mostra uma busca árdua no caminho do desenvolvimento de uma escola de interpretação específica para o cinema, ou seja, no desenvolvimento de um método codificado. E a grande questão não é o porquê, mas sim o como e a construção de sua forma. O ator brasileiro possui uma grande intuição e uma diversidade cultural ampla e magnífica. Isto é matéria-prima necessária para se tecer uma gramática cinematográfica, mas só isto não basta. É necessário ter uma formação técnica e intelectual mais apurada e um amplo domínio do ofício.
No quesito formação há vários pontos a serem analisados. Dentre eles, e que representa um dos grandes problemas, encontra-se na base, nas escolas de teatro, durante a formação do ator, que lê pouco e assiste a poucos filmes, além de aprender técnicas de voz que não se aplicam ao cinema. E assim, quando o ator resolve trabalhar no cinema, ele está mal formado técnica e intelectualmente.
O cinema é uma arte cruel, o realizador não está todo dia debruçado sobre seu ofício e envolvido na atividade cinematográfica e no aprofundamento de seu conhecimento, então, a cada filme é um recomeço e um novo aprendizado.
O cinema brasileiro é carente de diretores que realmente dirijam seus atores e que tenham interesse no trabalho do ator e suas especificidades. No Brasil, o setor está impregnado por um profissional chamado preparador de elenco (profissão que só existe aqui). Assim, o diretor abdica de suas responsabilidades como diretor, dessa relação íntima e profunda, que é o contato diretor-ator, e deixa que o preparador de elenco se interponha neste processo. É uma deturpação da relação ator-diretor. O elemento mais humano que temos num set de cinema é o ator. Quando o diretor contrata um profissional pra fazer o que deveria ser o seu trabalho, uma pessoa que, em alguns casos, chega até a marcar cenas e interferir na linguagem e na narrativa do filme, é hora de pensar que tipo de cinema está sendo feito.
Outro grande problema são as propostas estético-narrativas e a grande pergunta é: Qual é o cerne da questão, o debruçamento do diretor em um conhecimento mais profundo do oficio do ator ou no discurso dialético entre o real e o falso? A busca é por uma pseudoverdade ou uma tomada de consciência que tudo é artifício? Quem é natural diante de uma câmera? Um personagem de documentário pode ser mais falso do que em uma ficção? O inconsciente audiovisual brasileiro é televiso e impregnado de um falso naturalismo.
Na Academia Internacional de Cinema existe um laboratório de direção de atores, que foca essencialmente na relação diretor-ator, em uma busca por uma compreensão e pelo desenvolvimento de métodos e técnicas específicas para o trabalho do ator no cinema. Na negação da teatralidade que permeia algumas escolas de interpretação, e na rejeição de um falso naturalismo televisivo.
A oficina de direção de atores da AIC tem por meta transmitir instrumentos para que o aluno tenha a compreensão prática e teórica da relação entre diretor e ator em um set de cinema. A parte teórico-expositiva alia análise de escolas de interpretação dentro do contexto histórico do cinema e seus desdobramentos. A parte prática consiste na análise de roteiros, onde se estuda o perfil do ator, a construção de um perfil de personagem, casting e mise en scène. Os exercícios são gravados em estúdios, editados e analisados.
Para finalizar, um pensamento de Michelangelo Antonioni: “(…) Eu prefiro chegar aos resultados através de métodos secretos; isto é, estimular no ator certas qualidades inatas de sua existência, as quais ele mesmo desconheça – excitar não sua inteligência, mas seu instinto – não dar justificações, mas iluminações. Quase é possível enganar um ator, pedindo-se uma coisa para obter outra. O diretor precisa saber como pedir, e como distinguir o que é bom e ruim, útil e supérfluo, em tudo aquilo que o ator oferece. A primeira qualidade do diretor é a de ver. Esta qualidade também é válida no trato com os atores. O ator é um dos elementos da imagem”.