Anita Rocha da Silveira fala sobre suicídio, filmes e machismo
Anita Rocha da Silveira, roteirista e diretora do premiado “Mate-me Por Favor”, abriu ontem a Semana de Orientação da Academia Internacional de Cinema (AIC) do Rio de Janeiro, evento já tradicional que conta com a exibição de filmes e bate-papo com cineastas nacionais e internacionais.
“Mate-me Por Favor”, que ainda percorre os festivais e só será lançado comercialmente pela Imovision em abril, foi exibido no estúdio da AIC para uma plateia que não se acanhou mesmo com o temporal do fim de tarde.
Depois da exibição Anita contou um pouco de tudo. Começou falando sobre a ideia de ser atriz, a típica pressão familiar sobre a escolha da profissão, a entrada na faculdade de comunicação ainda com 17 anos, onde conheceu Cecília, que se tornou uma amiga inseparável.
Foi com a amiga Cecília que Anita fez o primeiro curso na área do audiovisual, estudaram documentário com João Moreira Salles e ali começou o interesse pelo cinema como profissão.
Cecília se suicidou, aos 19 anos e foi tentando achar explicações para a perda que Anita começou a pesquisar sobre suicídio e aos poucos, misturando realidade e ficção, construir a ideia dos seus filmes.
Trocou a comunicação pelo cinema e em 2008 fez seu primeiro curta, “O Vampiro do Meio-Dia” que emplacou festivais e rendeu prêmios em dinheiro, que foram investidos no segundo curta. “Handebol” (2010), recebeu o Prêmio Especial do Júri no Curta Cinema e o Prêmio da Crítica Internacional (FIPRESCI) no Festival de Oberhausen de 2011. Em 2012 fez “Os Mortos Vivos”, todos os três curtas trazem referências, de alguma forma, da amiga morta.
“Todos os meus filmes têm questões pessoais, trazem memorias afetivas. A violência, o desejo/medo da morte, a dinâmica da amizade feminina, a temática adolescente, o Rio de Janeiro. Nesse momento da carreira é importante para mim trabalhar com coisas que eu conheço, que estão próximas”, conta.
Depois de falar sobre os curtas, Anita contou sobre o processo de “Mate-me Por Favor”, o primeiro longa, que segundo ela é um reflexo sobre de sua geração e que também traz características da amiga na personagem principal, Bia, que flerta com a morte o tempo todo.
Anita contou sobre o difícil processo de escolha das atrizes que iniciou com 500 currículos enviados por e-mail e terminou com uma série de testes entre meninas que tinham a mesma idade das personagens. Falou sobre a busca de financiamento, sobre o primeiro edital ganho de coprodução com a Argentina, sobre orçamento e sobre rodar em 5 semanas ainda sem algumas locações definidas.
“O primeiro argumento, totalmente diferente do filme que assistiram hoje, começou a ser escrito em 2011, o primeiro roteiro ficou pronto em junho de 2012, depois disso o roteiro passou por um laboratório em Cannes e por uma consultoria, mudei muita coisa. Rodamos em fevereiro de 2014 e começamos a montar somente em setembro”, conta a diretora.
Anita respondeu às perguntas do público e contou curiosidades. Falou sobre sua paixão por David Lynch, sobre algumas referências como a diretora francesa Claire Denis e o fotógrafo Philip Lorca.
Também falou sobre a escolha de não trabalhar com personagens adultos – “queria construir um universo sem a figura do mentor”-, e sobre como ficou abalada com a morte da atriz Daniela Perez e como esse fato real se mistura na trama do filme.
Por fim, o tema machismo veio à tona e Anita mostrou que os conselhos dos professores da faculdade não a abalaram: “Escutei que mulheres deveriam trabalhar com montagem, já que era algo parecido com costura”, conta. Mas, para a nossa sorte, o brilho e o talento da menina-cineasta não puderam ser escondidos atrás de nenhuma moviola e estão por aí, ganhando prêmio e percorrendo festivais. Que seja o primeiro de muitos longas inspiradores.
*Fotos Karol Salldanha